quarta-feira, 22 de setembro de 2010

O valor estratégico do selo “Made in Brazil”


Na economia de baixo-carbono os produtos brasileiros já arrancam com uma enorme vantagem comparativa sobre seus concorrentes. Veja a razão.
No final do ano passado, o Brasil anunciou metas para reduzir as emissões dos gases efeito estufa (gee) entre 36% e 39 %, tendo como base as emissões lançadas em 2005, até o ano limite de 2020. Semanas atrás o governo divulgou noticia de que em breve haverá o desdobramento pragmático destas metas sendo que alguns setores da economia receberão tetos para emissão de gee.
Ou seja, já se vislumbra o controle nacional das emissões de carbono via estabelecimento de limites setoriais. Primeiros os setores da economia e depois empresas deverão receber limites de emissões a serem cumpridos.
Naturalmente todo este cenário pressupõe a operacionalização de um sofisticado e inovador mecanismo de mercado dotado de instrumentos econômicos, jurídicos e tributários que proporcione, sobretudo, parâmetros confiáveis e seguros para as operações mercantis que ocorrerão. Tanto para compradores nacionais quanto internacionais.
Será o Mercado Voluntário Brasileiro com operações comerciais de créditos de carbono “intra” e “entre” as empresas nacionais e multinacionais. É esperado que haja uma dinâmica de negócios similar ao sistema europeu,o EU- ETS, de forma a agilizar o cumprimento das metas e motivar o aspecto econômico-financeiro de mercado.
Sistema Europeu
No sistema europeu as nações recebem cotas de emissões que são desdobradas em metas entre alguns segmentos da economia como produção de cimento, geração de energia ou o setor de transportes, apenas para citar alguns. Quando estes limites pré-estabelecidos não são cumpridos, há a possibilidade de complementá-las com a aquisição de créditos de carbono para a compensação do limite excedido.
Na prática, as corporações que ultrapassam seus limites de emissão podem adquirir créditos de carbono gerados em outros países, como o Brasil, Índia ou China, e assim cumprirem suas metas. Outra possibilidade são empresas que em posição “superavitária” em relação às suas metas, podem ofertar seu excedente de carbono ao mercado.
Importante enfatizar que este mecanismo favorece o planeta, reduzindo sim as emissões globais dos gee e gera divisas aos países geradores dos créditos de carbono. O Brasil já exportou quase U$ 500 milhões em créditos de carbono.
Economia de baixo carbono
Já está se falando hoje, que os países estabelecerão barreiras alfandegárias protecionistas relacionadas às emissões de carbono. Mecanismos de gestão e controle passarão a avaliar a intensidade de carbono emitido durante os processos produtivos dos bens. Sobretudo o quesito ambiental será o mais exigido por conta dos resultados nefastos que provoca no clima e por consequência os prejuízos generalizados as economias.
Indicadores que controlam a quantidade de toneladas de carbono emitidas por tonelada produzida passarão a ser os “Indicadores Críticos de Performance”.
Quanto maior for a quantidade de carbono emitida por tonelada produzida mais sobretaxado será o bem produzido.
A “pegada ambiental” representará um indicador de competitividade. Pegada ambiental significa o impacto negativo imposto à biodiversidade para se produzir determinado produto ou serviço. Quanto mais “pesada” a pegada ambiental, menor valor e menos competitividade terá o item produzido.
Mais carbono emitido, mais valor destruído. Na economia de baixo carbono a quantidade de emissões de gee se tornará fator crítico para o sucesso das empresas, setores e países.
Porque será mandatório
Viver em uma sociedade de baixo-carbono já está se tornando uma exigência nos países mais desenvolvidos. Europa e Escandinávia discutem como sobretaxar suas emissões e as respectivas populações diariamente são provocadas por campanhas de conscientização fazendo alusão ao tema. E a tendência é que este comportamento estenda-se por todo o planeta.
Hoje a maioria da comunidade científica e parte da sociedade converge para a opinião de que catástrofes climáticas são decorrentes das ações do homem e, portanto ele é o responsável pelo aquecimento do planeta. É corrente encontrar afirmações de que quanto maior o aquecimento global, piores serão as conseqüências climáticas. E ninguém em sã consciência deseja contribuir para isto.
Além disso, os países ricos não desejam continuar reféns dos combustíveis fósseis e seus derivados, cujos produtores encontram-se majoritamente localizado em regiões politicamente instáveis, com alto risco de cartelização e pressão constante para elevação de preço. Os países desenvolvidos procuram ser menos carbono-intensivos penalizando o uso do combustível fóssil e promovendo energias alternativas, mais limpas.
Vantagem comparativa
No Brasil, a matriz energética de origem hidrológica é limpa e renovável em sua maior parte. As emissões de gases de efeito estufa decorrentes para produção de energia são baixas quando comparadas a maioria dos outros países.
Adicione-se a questão da matriz energética o modelo do etanol brasileiro. Parte significativa da frota nacional opera com um combustível renovável, que emite pouco carbono, considerado o balanço entre produção e uso. Além disso, existe a co-geração de energia que é gerada pela queima do bagaço e responde por 12,6 % de toda a energia gerada no país (balanço energético 2009).
A questão das florestas vem complementar. A extensa área florestal representa um gigantesco sumidouro de dióxido de carbono além de estocar bilhões de toneladas de carbono em suas árvores. No contexto global, o Brasil está classificado como o quarto grande emissor de gases de efeito estufa, mas isto acontece por conta do desmatamento e queimadas para produção agropecuária. E há de se convir que controlar emissões por desmatamento e queimada não é tão crítico quanto controlar emissões para geração de energia, como nos países europeus e asiáticos.
Na Ásia, Europa e América do Norte, a geração da energia é primordialmente baseada no combustível fóssil. Estabelecer controle sobre as emissões de carbono significa impacto direto no crescimento econômico e entre outros aspectos, no conforto do cidadão, pois boa parte da energia gerada serve para aquecer residências e prédios durante os invernos. Daí a polêmica em como controlar as emissões e em que patamares as reduções seriam aceitáveis. Sob este contexto a gestão do carbono tomou proporções muito maiores e mais complexas para estes países.
Competitividade Intrínseca
É nesta conjuntura global que os produtos brasileiros competem e já partem com um grande diferencial competitivo original, intrínseco. Feitos os cálculos apresentam baixa intensidade de carbono, podendo reduzir ainda mais com as metas assumidas pelo governo. Vale lembrar que hoje o principal direcionador de valor, no mundo todo, ainda é preço, uma vez que a questão da qualidade está praticamente nivelada.
Mas isto está começando a mudar. Os aspectos socioambientais estão ganhando espaço e cada vez mais serão considerados como os “verdadeiros diferenciais” no momento da escolha e aquisição de um determinado item pelo cidadão-consumidor.
É o momento de se pensar num grande inventário da biodiversidade em nível internacional. Reconhecido e chancelado pela comunidade cientifica, classificando a competitividade dos países pela pegada ambiental gerada na produção de seu PIB e pela preservação de seus estoques de recursos naturais.
Agora é o momento adequado para criação do selo “Made in Brazil”.
Texto de Laércio Bruno Filho (Professor do MBA da ESALQ/USP para a disciplina Agronegócios; Coordenador e Relator do Subgrupo Florestas da FIESP/ABNT, Coordenador do Grupo de Estudos sobre Gestão da Sustentabilidade do GESTEC/Business School São Paulo. Diretor de Novos Negócios Socioambientais e coordenador da Gestão Técnica de Programas de Sustentabilidade Empresarial e de Desenvolvimento Sustentável para Municipios pela empresa eSENSE Consultoria em Competitividade e Sustentabilidade Empresarial.- http://sendosustentavel.blogspot.com/)

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