terça-feira, 22 de março de 2011

O segredos das 10 +

O que está por trás do desempenho das companhias que mais se valorizaram em 2010 na bolsa? Conheça as estratégias que as levaram para o topo.
Por Eliane Sobral, Érica Polo e Crislaine Coscarelli.
Quanto vale o sangue-frio de um alto executivo que se encontra em meio a um fogo cruzado? No dia em que a Vivo anunciou o maior plano de expansão da tecnologia sem fio 3G de uma empresa no Brasil, em junho do ano passado, seus dois principais acionistas estavam em pé de guerra.
A Telefônica e a Portugal Telecom, donas da Brasilcel, holding que detinha 60% do capital da operadora brasileira, estavam em luta pelo seu controle. Os espanhóis queriam comprar, mas os portugueses não queriam vender.


Foi uma disputa espetacular, encerrada após um mês com um cheque de E 7,5 bilhões, assinado por César Alierta, o chefão da Telefônica. Durante sete meses, no entanto, coube a Roberto Lima, o presidente da Vivo, sobreviver à tensão para manter a operação e a credibilidade da marca a salvo.
Uma negociação desse porte gera insegurança, mas conseguimos atravessar aquele momento sem maiores turbulências, diz Lima. É verdade: o bom desempenho da companhia em 2010 a colocou entre as dez mais valorizadas do ano na bolsa de valores, segundo estudo da Economática feito para a DINHEIRO.
No seleto clube das 10+, só foram consideradas empresas com patrimônio líquido superior a R$ 100 milhões e, claro, estratégias vencedoras reconhecidas pelos investidores e traduzidas em alta das cotações na Bovespa.
No caso da Vivo, o lucro líquido em 2010 foi o maior em seus oito anos de existência: R$ 1,9 bilhão, 115% a mais que o de 2009. Suas ações ordinárias (com direito a voto) subiram 110,5%, um sinal de que a direção conseguiu driblar a instabilidade gerada pela briga dos dois sócios, blindando os negócios.
Nunca deixamos de investir para manter a performance, afirma Lima. "Isso gera confiança não só nos investidores, mas também nos clientes e nos funcionários. Por ter aproveitado as oportunidades de negócios abertas pelo crescimento de 7,5% da economia brasileira, a Vivo está, literalmente, em boa companhia.
Do seleto grupo das 10+ do ano passado, fazem parte Hering, Le Lis Blanc, Lojas Marisa, Marcopolo, Tupy, Alpargatas, Iochpe-Maxion, OdontoPrev e OHL. Suas ações subiram entre 79% e 183% num ano em que o Ibovespa, termômetro do mercado, se estagnou em 1% de alta. Mas o que está por trás desses números? Quais os segredos de gestão para atingir esse desempenho excepcional?
Estratégias certeiras, transparência na relação com os investidores e consistência na busca e na entrega dos resultados são pontos em comum. No caso da Vivo, a chave foi manter a média de investimentos entre 15% e 20% da receita. Em 2010, foram desembolsados R$ 2,5 bilhões.
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Simultaneamente, a empresa anunciou a ampliação da cobertura 3G para levar até o final de 2011 a banda larga móvel a 2.832 municípios brasileiros, o dobro de cidades que cobre atualmente. Detalhe: esse programa foi anunciado no mesmo dia em que os executivos da PT recomendavam aos seus acionistas que recusassem a oferta de E 6,5 bilhões feita pela Telefônica.
Lima também decidiu não ter mais funcionários terceirizados ? eram 5,3 mil e foram todos contratados, o que melhorou a satisfação interna e a qualidade na prestação dos serviços. É o que faz o investidor ter confiança e comprar seus papéis: consciência dos resultados?, diz Lima.

Esse discurso poderia ser proferido por Márcio Utsch, presidente da Alpargatas, dona das marcas Mizuno, Topper, Rainha e da globalmente conhecida Havaianas. ?Não prometemos mais do que podemos entregar?, afirma Utsch, que viu as ações da Alpargatas se valorizarem 92,7% em 2010, em função das expectativas otimistas.
Segundo números divulgados pela empresa na sexta-feira 18, a Alpargatas encerrou o ano com lucro líquido de R$ 303 milhões, um crescimento de impressionantes 147%. O Ebtida, indicador que reflete a geração de caixa, deu outro salto considerável, de 38%, somando R$ 400 milhões.
O caixa, ao final do exercício, somou R$ 655 milhões, 114% a mais do que em 2009. E daí? ?Ter dinheiro em caixa é uma sinalização importante para os investidores e também nos dá fôlego para uma política agressiva de aquisições, afirma Utsch.
 
Em um segmento que sofre uma forte concorrência de preços dos produtos chineses, o trunfo da Alpargatas foi criar marcas que são desejadas pelos consumidores. As vendas cresceram 11%, para 244 milhões de pares. ?Não vendemos chinelos, vendemos Havaianas?, diz Utsch. Ele quer agora replicar a história de sucesso de Havaianas para outras marcas da companhia.

A primeira da lista é Topper, que a Alpargatas quer transformar em líder regional no segmento de materiais esportivos, uma espécie de Nike da América Latina e adjacências.

Até pouco tempo atrás restrita a artigos para futebol ? como bolas e chuteiras ?, a marca Topper já começou a se mostrar em outros campos. O primeiro é o rúgbi, que entrará pela primeira vez em uma Olimpíada exatamente aqui no Brasil, em 2016.
Mas não é só. Uma boa tesourada nos custos, como deve fazer o governo Dilma, explica parte do sucesso da empresa na bolsa. ?Cortamos tudo o que se possa imaginar de despesas e fizemos uma reengenharia nos processos de produção para reduzir custos?, resume o presidente.
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Encontros semanais com quatro diretores resultaram em revisões gerais, desde contratos de limpeza e segurança até o layout de fábricas para tornar mais ágeis e menos onerosos os processos produtivos.
Em números, esse trabalho significou redução de 12,3% nos resíduos industriais, de 7,2% no consumo de energia e outros 20% no de água. ?Só não mexemos nos investimentos em marketing, na casa dos 12% a 13% da receita?, afirma.

Impulsionado pela avidez com que a classe média emergente foi às compras em 2010, o comércio foi um dos expoentes do crescimento econômico brasileiro no ano passado, com alta de 10,1% sobre 2009, segundo dados do IBGE. Por isso mesmo, não é de estranhar que as três empresas cujos papéis mais se valorizaram em 2010 tenham uma forte presença no setor varejista: Hering, Le Lis Blanc e Lojas Marisa. 
 
As três souberam, mais do que suas rivais, captar os sinais de expansão da atividade, em todas as classes sociais e expandir-se geograficamente por meio de lojas próprias e franquias.
 
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A Hering, que ficou no topo das dez + com a alta de 183% na bolsa, aumentou sua receita bruta em 40,8%, para R$ 1 bilhão. Fundada em 1880, a empresa de Blumenau (SC) dirigiu boa parte de suas energias para expandir-se no varejo por meio de franquias.
 
Dona de marcas como Hering, Hering Kids, PUC e dzarm, encerrou 2010 com 347 lojas, dez a mais do que o inicialmente previsto. ?Já revimos nossa previsão para 2011 e devemos chegar ao final deste ano com 418 pontos de venda?, disse Fábio Hering, presidente da companhia, no início de março, ao apresentar os resultados de 2010.

Há demanda para isso. ?Por meio das franquias, eles ocuparam espaço rapidamente?, diz Alberto Ferrentino, sócio-sênior da consultoria GS&MD.
 
A estratégia vencedora foi transformar a tradicional marca dos dois peixinhos em um ícone da moda casualwear e de camisetas desejada por consumidores de todas as classes sociais. ?A Hering está longe de ser uma Lacoste ou uma Track&Field, mas há espaço para que ela se posicione como essas marcas?, afirma Cláudio Felisoni, coordenador do Programa de Administração do Varejo (Provar), da USP.
 
Agora, a companhia quer dar impulso à marca dzarm, de roupas para jovens. Vamos, inclusive, contratar celebridades para promover a marca?, diz Hering. Uma das metas para este ano é reforçar o comércio eletrônico, canal de vendas que mais cresce na empresa. Temos uma avenida enorme pela frente, afirma o executivo.

Ao contrário da Hering, a grife de roupas e acessórios femininos Le Lis Blanc, voltada para as consumidoras de maior poder aquisitivo, optou pela estratégia de manter lojas próprias. Segundo Márcio Camargo, presidente do conselho de administração da Le Lis Blanc, essa orientação foi adotada para elevar a margem de lucro.
 
Os investidores gostaram: alta de 174,7% na bolsa, a segunda maior dentre as 10+. Criada em 1988, pelas estilistas Waltraut Guida e Rahyja Afrange, a Le Lis Blanc acelerou em 2007 quando foi adquirida pelo fundo de investimentos Artésia, de Camargo e de seu sócio Marcelo Lima, ex-executivos do falecido Banco Garantia.

Atualmente, conta com 57 lojas, incluídas as unidades da Bo.bô, voltada ao público jovem, mas quer triplicar esse número rapidamente? Nossa meta é chegar a 2012 com 151 lojas, divididas entre as duas marcas?, diz Camargo? A Le Lis Blanc ficará com 95 e as outras 56 serão da Bo.bô?
 
A ideia de Camargo, que vai investir R$ 60 milhões no projeto de crescimento, é promover a desconcentração regional da rede. Além de abrir unidades no interior do Estado, a Le Lis Blanc pretende espraiar-se para outras regiões do País. Quase 50% da expansão prevista para 2012 deverá acontecer fora do Sudeste.
 
A ampliação física também foi uma alternativa utilizada pela Lojas Marisa para aproveitar o boom de consumo. No seu caso, a opção preferencial se deu pelos consumidores da classe C emergente. A rede investiu R$ 128 milhões na abertura de 53 lojas, no ano passado.
 
São ao todo, 277 unidades em cidades com mais de 100 mil habitantes, em praticamente todo o País. Outro detalhe é a política de saturação, com a instalação de lojas próximas umas das outras.
 
Em Porto Alegre, numa extensão de menos de 300 metros, na tradicional rua da Praia, há três lojas com a bandeira da Marisa. Outra inovação do ano passado foi a criação da marca Marisa Lingerie.
 
Instaladas em áreas de 250 metros quadrados, menos da metade ocupada pelas lojas tradicionais, as lojas de roupas íntimas reforçaram a estratégia de ocupação de território pela via da segmentação.

Pesquisas mostram que a mulher tem momentos de compras diferenciados?, afirma Márcio Goldfarb, presidente da Marisa, empresa fundada por seu pai, Bernardo Goldfarb. Às vezes, ela quer comprar um lingerie sensual e não quer fazer essa compra enquanto procura um presente para a família.
 
Segundo Goldfarb, o segredo da Marisa é o acerto na escolha de suas coleções. Se não conseguir sintonia com o desejo das consumidoras, pode ver o estoque encalhar.
 
Para colocar nas lojas tecidos, cortes e cores que agradem às mulheres, a companhia utiliza-se de uma estratégia que parece simples, mas movimenta um pequeno exército de 24 pessoas que trabalham em seu centro de desenvolvimento de moda.
 
Esse grupo viaja pelo menos três vezes ao ano para o exterior em busca de tendências. São também figuras assíduas dos principais desfiles do planeta, que acontecem em Paris, Milão e Nova York. A equipe, que já existe há oito anos, é considerada fundamental por Goldfarb para atrair as mulheres da classe média. ?Essa consumidora não quer só comprar barato?, afirma. Quer comprar também moda.
 
Com isso, a Marisa consegue acertar a coleção e trabalhar com um nível de estoque baixo. Para qualquer varejista, isso significa mais dinheiro em caixa. E foi o que não faltou em 2010: no ano passado, a rede faturou R$ 2 bilhões.
 
Em setores completamente opostos ao das grifes de vestuário, estão empresas menos conhecidas pelo grande público, mas figuraram no radar dos investidores e viram suas ações subir como um foguete em 2010.
 
São os casos de Marcopolo, Tupy e Iochpe-Maxion, que atuam no ramo de componentes para o setor automotivo, não por acaso um dos ramos da indústria que estrelaram o espetáculo do crescimento da economia brasileira nos últimos anos.

A primeira produz ônibus. A segunda faz blocos e cabeçotes de ferro para motores de ônibus e caminhões. E a última faz autopeças e máquinas agrícolas.
 
Como poucas do setor, as três companhias souberam aproveitar o crescimento de 33% na produção de ônibus e de 55% na de caminhões, no ano passado.?Quando todo mundo parou de investir, em 2008 e 2009, a Marcopolo continuou com seu programa?, afirma o presidente da companhia, José Rubens de La Rosa.
 
De 2008 a 2010, foram investidos R$ 330 milhões. Neste ano, serão mais R$ 70 milhões, aplicados nas fábricas brasileiras em Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, e Duque de Caxias (RJ), e nas do Exterior (China, Egito, África do Sul, Índia, México, Colômbia e Argentina). Com isso, de La Rosa espera produzir 29,3 mil ônibus, que deverão gerar um faturamento de R$ 3,1 bilhões.
 
No caso da Iochpe-Maxion, dona de uma receita de R$ 2,2 bilhões, no ano passado, os investidores perceberam os esforços do presidente Dan Ioschpe para reduzir custos durante a crise econômica global, segundo o analista do Santander, Daniel Gewehr.

A Tupy, por exemplo, não demitiu nenhum funcionário durante a crise de 2008 e 2009. ?Quando os negócios se aqueceram de novo, conseguimos atender à demanda prontamente?, diz Luiz Tarquínio, presidente e diretor de relações com os investidores da companhia baseada em Joinville.
Para formar e qualificar um operário, a Tupy, que faturou R$ 1,3 bilhão nos primeiros noves meses de 2010, necessita, no mínimo, três meses de treinamento.
Graças a essas políticas, a trinca do setor de autopeças pôde garantir um lugar entre as 10+ da Bovespa. A Marcopolo viu a valorização de suas ações aumentar 119,2%, seguida pela Tupy, com 104%, e pela Iochpe-Maxion, com 92,2%. 
A continuar o crescimento da economia, mesmo que em ritmo mais reduzido, a perspectiva é de que os papéis desse grupo continue em alta, a despeito dos solavancos do primeiro trimestre? Nosso ramo de atividade é atraente por conta da enorme demanda por investimentos em infraestrutura no Brasil?, afirma Tarquínio.
Conhecidos de longa data dos investidores, Marcopolo, Tupy e Iochpe-Maxion transformaram-se, ao lado de nomes como Alpargatas e Hering, em queridinhos do mercado de ações. Em 2010, um punhado de novatas veio fazer-lhes companhia no grupo das 10+. Desse grupo, Le Lis Blanc, Marisa e Vivo foram as que mais brilharam, ocupando três das cinco primeiras posições do ranking.

Embora tenham tido um desempenho inferior ao das outras três, a OHL e a OdontoPrev tiveram desempenho para ninguém botar defeito, superando nomes como Renner e Souza Cruz, que tradicionalmente ocupavam as primeiras posições no pódio. Em 2010, os papéis da OdontoPrev tiveram alta de 89,4%; os da OHL, 79,1%.
Controlada pela espanhola OHL Concesiones, a OHL atua há menos de uma década no País. Começou a operar no mercado interno ao vencer a maior parte dos leilões do programa de concessão das estradas federais brasileiras, em 2007.
Na época, o mercado se assustou com o preço das tarifas nos pedágios. Na rodovia Régis Bittencourt, que liga São Paulo a Curitiba, a OHL se comprometeu a cobrar R$ 1,36 por carro pedagiado. Já na Fernão Dias, entre São Paulo e Belo Horizonte, o valor ficou abaixo de R$ 1.
Essas tarifas representavam, em média, um terço das praticadas em outras rodovias nacionais, de acordo com a Agência Nacional de Transportes Terrestres. A aposta dos espanhóis para tornar o negócio rentável, era no aumento da demanda. E deu certo. O fluxo de veículos das nove concessões da OHL (quatro estaduais e cinco federais) cresceu 40% no último trimestre de 2010. Esse aumento refletiu o bom momento da economia no País, afirma José Carlos Ferreira de Oliveira Filho, presidente da OHL Brasil.
Neste ano, só nas concessões estaduais, a meta da empresa é investir R$ 600 milhões. Nas federais, a estimativa de investimento é de R$ 4 bilhões até 2014. Até setembro do ano passado, a OHL, que estreou na Bovespa em 2005, faturou R$ 1 bilhão.

Com receitas de R$ 698 milhões, a OdontoPrev tem uma história mais recente do que a da OHL na bolsa ? seu IPO aconteceu no final de 2006. De lá para cá, a empresa de assistência de saúde dentária não parou de crescer.
Esse desempenho não passou despercebido na Cidade de Deus, onde está instalada a sede do Bradesco. Resultado: no final de 2009, a OdontoPrev se uniu à Bradesco Dental, dando origem ao maior grupo de planos odontológicos do País.
A associação fez a companhia, que já tinha 2,4 milhões de clientes, ganhar 1,2 milhão de novos associados. ?A associação trouxe mais credibilidade e força para a nossa operação?, afirma Randal Zanetti, presidente da OdontoPrev. Ganhamos mais evidência.
A empresa, que também fez acordo semelhante com o Banco do Brasil, fechou 2010 com quase cinco milhões de associados, um crescimento de 20% ao ano anterior à fusão. A maior evidência mencionada por Zanetti desembocou diretamente no comportamento das ações da OdontoPrev que se valorizaram 89,4% no ano.

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